sábado, 20 de outubro de 2018

Síndrome de Engels

Vamos falar do dinheiro, símbolo da riqueza, invenção que possibilitou o progresso comercial e posteriormente industrial do mundo.

Não vamos ensiná-lo a ficar rico, não vamos ensinar como ganhar dinheiro e nem como mantê-lo. Nossa abordagem será o lado psicológico.

O pão duro

O indivíduo "pão duro", que "não abre a mão prá nada", é um exemplo de manifestação da relação da pessoa humana com o dinheiro. Este se divide em dois tipos:


  • O que diz que não distribui aquilo que suou tanto para ter;
  • O que, depois de ganhar o dinheiro, não se admite gastar, pois sente culpa por ter mais que os outros;
  • O que tem amor ao acúmulo de riqueza;

O rico

Existe um quarto tipo que deve ser enumerado agora, para não perdermos a sequência de tipos:

  • O que nasceu rico, e que se sente culpado por ter mais que os outros;
  • O que nasceu rico e que ajuda os outros sem culpas;
  • O que ficou rico, sabe da dificuldade que enfrentou, e que só gasta naquilo que compensa;

O normal

O indivíduo normal ganha o seu dinheiro, gasta moderadamente consigo mesmo e também dispõe de seu dinheiro em prol dos outros eventualmente.

Comentário

Estes transtornos não são artificiais. Você diria que a invenção do dinheiro é que gerou isto. Não. O advento do dinheiro, ou seja, da moeda, apenas fez aflorar um aspecto psicológico que já existe latente dentro do ser humano, muito comentado, o egoísmo e o amor próprio.

Dentro dos tipos, para o fim deste artigo, vamos discutir o mais angustiante:
  • O que, depois de ganhar o dinheiro, não se admite gastar, pois sente culpa por ter mais que os outros;
Vamos dar um exemplo histórico, notório e de consequências para a nossa história.

Friederich Engels

O pai de Friederich Engels montou uma tecelagem nos tempos da Revolução Industrial, na Inglaterra. Como todo empresário, naquela época, oprimia os seus empregados, pagando pouco e explorando ao máximo os seus empregados. Isto não passava desapercebido do jovem Engels. E sua culpa interna pela opressão que o pai exercia sobre os empregados chegou ao nível de produzir em Engels a identificação com os empregados.

A identificação de Engels com os empregados da fábrica de seu pai foi tão forte, que ele se casou com uma das trabalhadoras mais rebeldes desta fábrica: Lizzie Burns. Ele via claramente a diferença de condições econômicas entre o pai, patrão, e os empregados. E isto o incomodou profundamente.

Em Karl Marx, Engels achou mais um apoio intelectual e psicológico para o seu "complexo". Karl Marx teve um papel tão determinante em sua vida, para o aliviar deste fardo psico-social, que Engels passou a ajudá-lo financeiramente, pois a profissão de jornalista rendia pouco, quase nada, para Marx.

A síndrome

O que chamamos aqui de "síndrome de Engels" é este complexo que acompanha algumas pessoas que tem muito dinheiro. Caracteriza-se por uma sensação de empatia acrescida de uma culpa não adequada, pelo fato deste ter aquilo que o outro não tem.

E então, com o intuito de ajudar a estas pessoas, que sofrem caladas, ou ingressam no engano de achar que a a sociedade está errada, ou que eles mesmos estão erradas por terem mais que os outros, e começam a inventar desculpas teóricas ou formulam ideologias que pretendem fazer a perfeita divisão dos bens que o mundo disponibiliza.

As pessoas não são iguais

Dentro de cada um de nós a natureza deixou uma identidade biológica inquestionável da particularidade de cada um e de sua identidade na existência: um conjunto de pequenos filamentos de DNA em cada uma de nossas trilhões de células. Se o nosso interior biológico, que abriga aquilo que chamamos de alma (movimentadora do ser, e não associada a crença), possui uma assinatura ÚNICA, isto significa que somos diferentes uns dos outros.

É um engano acreditar que, pelo fato de construirmos uma sociedade, com língua e costumes comuns, pelo menos socialmente somos iguais. Não somos, e os eventos históricos que suscitaram disputas ideológicas, até se transformarem em conclitos armados, provam isto.

Existem pessoas dispostas sadias, doentes mas dispostas, sadios preguiçosos, sadios empreendedores, sadios com vocação para obedecer ordens, sadios para dar as ordens. Existem milhares ou milhões de combinações de características individuais que produzem esta variedade enorme de pessoas que vivem à nossa volta.

A cura para a síndrome

Para se livrar da síndrome, pense nisto, uma verdade simples da natureza: as pessoas não são iguais em seu ânimo, em suas impressões do mundo, em suas manifestações filosóficas e psicológicas.

Nenhuma doutrina, nenhuma lei, nenhum regime político vai igualar as pessoas, a não ser que promova uma lavagem cerebral coletiva em um povo específico.

Não se culpe se tem mais que os outros, nem se revolte em ter menos que alguns. A natureza foi soberana ao criar a humanidade, e gravou em seu DNA como você seria.

E se você tem pouco, procure se esforçar, trabalhar, vença suas fraquezas, aprenda a controlar suas angústias, e procure um consultório de psicologia, e não um partido político.





quarta-feira, 17 de outubro de 2018

Fenomenologia do Partidarismo

A proximidade das eleições e a atividade frenética do público em torno das ideias apresentadas, das ideologias propostas e das disputas verbais tem se tornado extremamente férteis mpara nós, psicólogas e psicólogos.

Forças psíquicas mobilizadas

Basicamente, o Partidarismo exacerbado mobiliza as forças da Identidade e da Autoridade. A Autoridade que promove a atração para o seu partido não precisa, necessariamente, ser forte. Apenas precisa ser mais forte que a "self-autoridade" que o indivíduo tem sobre si mesmo através da formação adequada de sua Identidade. Este é o princípio do equilíbrio destas duas forças.

À frente do Oráculo de Delfos, na Grécia antiga, havia a mais esclarecedora das frases a respeitop da Identidade:

CONHECE-TE A TI MESMO

Acrescente a isto a famosa frase de Hamlet:

SER OU NÃO SER, EIS A QUESTÃO

Identidade envolve, portanto, Julgamento e Decisão. Erroneamente se confunde Identidade com auto-conhecimento apenas. Identidade, uma fusão de caráter com personalidade, possui o ingrediente do Julgamento. Em determinado momento da vida, o indivíduo vai decidir se vai ser um Figurante no enredo da história da vida, ou um Protagonista desta história.

O mundo está repleto de figurantes, sem personalidade, com personalidade "muletada" na Identidade de outro, com alternância de personalidade, com dupla personalidade ou personalidade herdada (dispensando a "muleta" de outro). E destes, podemos tirar elementos comuns, chamados de Discípulo (que adquire uma doutrina e a compreende) ou Seguidor (cego, fanático).

A submissão

Uma vez não tendo uma Identidade definida, o Seguidor pode desenvolver uma Personalidade baseada no único interesse de sobrevivência na sociedade, e passará a carregar um "estandarte" de alguma legenda reconhecida pela sociedade, por sua virtude ou pelo respeito que inspira. As finalidades da legenda não interessam. Interessa apenas que este indivíduo psicologicamente incapaz, seja reconhecido.

Para tal indivíduo serve tanto o pertencimento a uma quadrilha de criminosos, quanto o pertencimento a um time de futebol famoso ou o pertencimento a um Partido numeroso e conhecido, amado ou temido.

Nesta modalidade, o valor individual se confunde com o grupo. Para reforçar, este espécime vai procurar andar com algo em seu corpo que possa identificá-lo como membro daquele grupo, time, partido ou instituição. "Folha carimbada se torna oficial".

Sinais do Partidarismo fanático

Por vantagem, ou por genuína fraqueza, o indivíduo de que tratamos pode se tornar inteiramente dedicado aquele em que apoia sua personalidade. Passa a defendê-lo, esteja ele certo ou errado, sendo inocente ou culpado. A gravidade do fenômeno se mostra quando o Seguidor é intelectualmente superior em instrução ao elemento que dita sua personalidade.

Na América Latina isto é particularmente percebível. Caudilhos absolutamente sem formação e sem cultura provocam a admiração de seus seguidores, mesmo sendo perversos, fascistas e bem ignorantes.

O natural é o Seguidor escolher alguém, pelo princípio da Autoridade, superior a si mesmo em conhecimento, em fluidez de raciocínio e em habilidade de proferir julgamentos sábios.

 Por que, então, os latino-americanos seguem os fracos, ao invés dos mais capacitados ? 

O Princípio da Autoridade explica isto, facilmente. Seguem justamente porque este líder fraco não lhes fere o orgulho. É o jogo do "engana dois". O líder incompetente se sente grande tendo seguidores. O seguidor se sente resguardado da superioridade efetiva, ou seja, no fundo sabe que é superior ao líder. Em outras palavras, vaidade do lado do líder e do liderado. O liderado ainda se sente um pouco poderoso ao líder, mas não declara isto a ninguém. Venerando o líder está massageando o próprio ego.

Concluindo

O Partidarismo sectário é consequência de construção defeituosa da personalidade e cria um monstro no líder incompetente. Muitos brasileiros, em manifestações, se declaram apartidários, pois perceberam a fraqueza de seus líderes, pessoas superficiais e sem expressão, mas que querem poder para alimentar a própria vaidade e suas contas bancárias.

sábado, 13 de outubro de 2018

Fantasia política - Perdendo a razão - Eleições 2018

Em texto anterior, procurei mostrar como o mergulho na política, só mais uma das "ilhas" da fantasia do indivíduo, pode transpor os limites sociais para enveredar em uma loucura controlada, aceita pelos outros.

Conhecimento e Razão

De suas experiências, bem ou mal sucedidas, tira o ser humano o seu Conhecimento Pessoal. Este Conhecimento Pessoal se une ao Conhecimento Social e ao Conhecimento Histórico.

Mas existe um Conhecimento Basal, Primitivo, algo como:


  • Os objetos caem para baixo;
  • A luz provoca sombra;
  • O ser humano enxerga somente o que está a frente;
  • Pessoas tem dois braços;
  • Nascemos e vamos morrer;
  • Meus pais normalmente vão morrer antes de mim;
  • Falar é fácil, fazer é mais difícil;
  • O natural do ser e dos objetos é a inércia;
  • Meus pais me amam;
  • Pessoas possuem empatia umas pelas outras;
  • O comportamento pessoal é um. O coletivo é outro;
  • Existe justiça, mesmo que tardia;
  • Alguém vai me amar;
  • Alguém vai me odiar;


A Razão espera estes tipos de manifestações naturais. Podem acontecer eventos que provoquem pequenos desvios:

Desvios do natural

Objetos podem "cair" para cima, se arremessados. Porém, sem força aplicada o objeto cai naturalmente. Retrovisores foram inventados para enxergar o que está atrás de nós, com os olhos virados para a frente. Pessoas podem perder não só um, como os dois braços em um acidente. Podemos morrer antes de nossos pais, de doenças ou de acidentes, mas a ordem natural é bem conhecida (tanto que a morte de filhos provoca imensa tristeza nos pais). Podem existir pais que não amam os filhos, mas o contrário é o natural. Pessoas com problemas psíquicos podem não ter empatia pelos outros.

Psicologia e Razão

Por que nasceu o estudo da Psicologia ? Porque se observou que, devido a traumas, fatos que excederam os limites da razão, fizeram com que alguns indivíduos apresentassem a crença de que a tabela do razoável não estava sendo obedecida em suas vidas, em um ou mais itens.

Um dos fatores que pode provocar desvios nesta tabela, é a opinião dos outros. Existe uma derivação da Opinião que podemos chamar de Indução (opinião proposital dos outros com o fim de influenciar alguém). Outra derivação é a Opinião Mórbida.

A Opinião Mórbida é um senso comum dos homens que os atrai para o pior. A pessoa vê um objeto que tem a aparência de estar pesado, pendurado por uma corda, e logo imagina que o objeto Pode cair. Em um nível mais grave, a pessoa imagina que o objeto VAI cair. A morbidez é natural no ser humano. Os jovens tem uma atração MÓRBIDA por filmes de terror. Vejam o caso dos filmes das séries Sexta Feira 13, Jogos Mortais, Pânico, Invocação do Mal, Exorcista e outros. Existem jovens que assistem a estes filmes e suas versões posteriores mais de uma vez.

Política e Razão

O que vou expor a seguir, na minha opinião, não deveria estar acontecendo com as pessoas, mas demonstra uma falha de amadurecimento da Razão muito fora do comum.

Em vista das vivências ou do volume de conhecimento coletado pela humanidade, o ser humano deveria estar cada vez mais razoávelem suas avaliações. A história universal já mostrou numerosas situações pelas quais a humanidade, como um coletivo, já passou.

Mas o fenômeno parece, a princípio, aparece ser genuinamente brasileiro.

Para nós psicólogos, a situação política brasileira é um "locus" de experimentação de uma situação bem crítica. O candidato à presidência Bolsonaro é como um monstro homofóbico, femeofóbico, bandidofóbico, negrofóbico, que cospe (não fala) fogo (não palavras) pelos microfones que lhe dão.

Para nós, o objeto de análise não é ele, por incrível que pareça, pois tipos como ele existem aos montes no meio de nossa população, escondidos por uma máscara de hipocrisia. O objeto de nossa análise está sendo o povo que o observa, que o ouve, que o execra, que o xinga.

Já analisamos o fenômeno do #Elenão. Agora vamos para aquela fronteira entre a Razão e a Fantasia Política, porque é Fantasia, como demonstraremos.

Faça esta pergunta a quem tem medo, ojeriza do candidato:

"Se for eleito, depois de tomar posse, você crê que Jair Bolsonaro vai colocar os homossexuais em uma prisão ?"

"Se for eleito, depois de tomar posse, você crê que Jair Bolsonaro vai colocar os negros em uma prisão ?"

"Se for eleito, depois de tomar posse, você crê que Jair Bolsonaro vai colocar as mulheres novamente submissas ao Pai ou ao Marido ?"

Este artigo não tem conclusão. Apenas me envergonho de ter que fazer, no século XXI, depois que o Brasil passou por tantas dificuldades, precisando se recuperar, ter que fazer perguntas como estas.





Vivendo no passado

A memória é o instituto cerebral de registro de experiências que nos protege da reincidência em erros, que guarda lembranças de quem amamos para sempre lhes retribuir este amor, e de quem quer nos prejudicar para que nos mantenhamos afastados deles.

Experiências

Como diz o nome, experiências são MODELOS de contexto/comportamento. Por exemplo, se somos roubadas na porta de uma padaria, a experiência serve para tomarmos cuidado naquele local e também nas lojas que tenham o mesmo perfil de contexto desta padaria. Se esta for uma loja de esquina, perto de uma comunidade, tomaremos cuidado em lojas com este tipo de configuração.

A experiência não pode ser tomada como REGRA. Tem pessoas que são assaltadas na frente de uma padaria e depois não voltam nunca mais nela. É mais ou menos como dizer "o raio não cai duas vezes no mesmo lugar". Se a pessoa cair nesta armadilha do SEMPRE NESTE LOCAL, vai enlouquecer.

Memória

Pois bem. A memória armazenou a experiência, com aquela configuração específica. A impressão fica como experiência.

Eu aviso, então, esperando prestar um serviço a muita gente que sofre:

Experiências não devem ser a Senhora Absoluta da sua vida

A memória pode te avisar se houver uma probabilidade de uma experiência vir a ser desagradável, mas isto não é uma verdade absoluta e nem uma CERTEZA em um outro tempo.

Qual é o limite

O limite de poder da memória é a fronteira do razoável quando se amadurece. Suas memórias de sofrimento, frente à dor, à angústia, em contextos que você nunca mais vai estar, DEVEM SER ABANDONADOS.

Se eu mudar de cidade, sabendo conscientemente que ela é mais segura, eu deverei me sentir mais segura, abaixando o meu grau de alerta frente àquela situação do contexto doloroso.

O lado positivo incômodo

Até agora tratamos do lado negativo das lembranças, que podem nos incomodar. Agora vou tratar do outro lado, que incomoda as pessoas à nossa volta.

As boas lembranças, de escolas de nossa mocidade, da Universidade e até de locais de trabalho, podem nos levar a ser extremamente chatas. Ao encontrar com amigos e conhecidos, evite contar sempre as mesmas histórias das situações que te deram prazer, pois

Só você sabe o valor de suas experiências pessoais

É como a sensação de sua formatura, do seu casamento, do seu primeiro filho. Só você tem a verdadeira dimensão deste fato. As outras pessoas não passaram por isto, pois não estão em seu corpo, em sua mente e nem em sua memória.

Concluindo

Não seja escravo de suas experiências. Se estiver nestas situações, procure ajuda. Não deixe que o "passado negativo" seja um pesadelo em sua vida, e nem que o "passado positivo" te torne um chato.








sábado, 6 de outubro de 2018

Dissecando o fenômeno #Elenão

Confesso que estou gostando deste período de preparação para as eleições mais esperadas dos últimos 12 anos. A ansiedade e a expectação para mudanças profundas estão fazendo aflorar, com mais facilidade, as raízes dos problemas que os paciente escondem involuntariamente. E isto está mais profundo no caso das pacientes do sexo feminino.

As variações

O assunto em torno deste movimento do #Elenão começou com as próprias pacientes, que não puderam se negar a falar de eleições. Como todo assunto leva ao interior emocional dos pacientes, não podemos tentar desviar, negar ou não discutir os aspectos desenvolvidos.

Uma das faces do assunto corresponde às dúvidas e questionamentos de uma senhora dos seus 58 anos, casada a mais de 20, com dois filhos. Ela me perguntou o que eu achava do candidato Bolsonaro. Não posso revelar preferências ou repulsas aos pacientes. Pedi que ela expusesse o que sentia em relação a ele.

Esta senhora tem uma filha que colocou na página de Facebook a "hashtag" #Elenão. Até ai estava no terreno de sua manifestação pessoal, e tudo se passou naturalmente. Há uns dias revelou o desejo de fazer uma tatuagem, e discutiu com o pai. E no meio da discussão ela o acusou de autoritário, de partidário de Bolsonaro, e a discussão ficou bem feia, com as frases habituais de "quando estiver mais velha vai entender" ou "quem paga as contas sou eu", etc.

A mãe ficou indignada com a posição da filha, pois não vê nenhuma coisa que desabone o candidato para o cargo de presidente, e principalmente reconhece nele o atributo de FAMÍLIA. Perguntei a ela se o pai é do tipo repressor. Ela negou, ressaltando que o pai deu celular e computador, fazendo recomendações mínimas à filha, e que não fica fiscalizando o que ela faz. Tem ele como um marido bom e pai liberal. A filha, excetuando os momentos em que quer fazer alguma coisa que o pai não concorda, conversa naturalmente com ele.

O segundo caso que quero citar é o de uma jovem de 32 anos, cujo pai se separou da mãe, para morar em outra cidade, com outra mulher, deixando a mãe como "pãe", forma que se descobriu hoje em dia para designar mães que também tem que assumir o papel de pais. Pois bem, a jovem é fervorosa ativista do #Elenão, congregando colegas e amigas para este grupo. Durante a consulta ela foi muito enfática, falando muito, com sua agressividade e sarcasmo naturais, maximizados pelo fato de estar sob o efeito de um "bek" (cigarrinho de maconha), como os jovens chamam. Crucificou o candidato da forma mais brutal possível. Esta moça tem períodos curtos de namoro, que acabam justamente, como ela mesma confessa, pela sua agressividade latente e pelos sarcasmos que faz. Ela se sente mais a vontade entre as amigas do que com os namorados com os quais fica.

Entendendo o movimento

O movimento não se gerou, como dizem, criado pela sociedade. Ele foi criado por uma mistura de sentimentos humanos derivados de uma mistura de fenômenos e variáveis psicológicos exaustivamente discutidos pela psicologia:


  • Laços familiares;
  • Autoridade paterna;
  • Afetividade feminina em relação ao homem;


Sem se dar conta, qualquer pessoa é afetada pelos efeitos cumulativos dos "tijolos" colocados durante a sua educação, cada um contendo uma impressão positiva ou negativa.

Começando a explicação, a que figura, contida nesses "tijolos" corresponde a figura do Presidente da República ? Para pessoas com um grau de racionalidade já desenvolvido, o Presidente é uma Autoridade sem vínculos afetivos. Para pessoas com uma baixa racionalidade, imaturas, o Presidente SE CONFUNDE, ERRONEAMENTE, com a figura de pai. E se houver um "ruído" durante a educação da pessoa, no caso, a mulher, em seu histórico de vida, o Presidente pode ser uma mescla de Pai com algum namorado cujo relacionamento foi profundamente negativo. Outros ruídos podem gerar, em uma jovem, uma figura distorcida daquele rapaz que se tornou inatingível para ela, ou por desprezá-la ou por ser muito idealizado para que ela tivesse a coragem necessária para se aproximar dele.

Se enumerarmos todos os casos com os quais tive que lidar, encontraríamos várias outras distorções psicológicas.

Entrando mais a fundo no caso específico, o candidato Bolsonaro tem ingredientes até mais agravantes:


  • É militar;
  • Tem opiniões muito firmes;
  • É direto, sem rodeios;
  • É classificado de direitista;


Isto agrava a semelhança do candidato à figura de pai, principalmente para as mulheres e mais profundamente para as jovens.

Mas existe um traço determinante, que, talvez, se não existisse, talvez a figura psicológica ficasse, de certa forma, escondida: o candidato SORRI.

Ora, ora, ora, mas um sorriso não atenuaria os aspectos que já citamos ? Digo a vocês que isto piora os efeitos de uma das figuras que elucidei aqui: a do namorado idealizado.

Muitos homens, para "ganhar" as mulheres, ocultam o "monstro" dentro de si. Escondem um predador que só quer sexo, e que não está disposto a estabelecer laços afetivos. E então utilizam a ferramenta social mais eficaz como escudo de sua própria agressividade: eles sorriem. E fazem muitas vítimas com isto.

Concluindo

Muitas das reações (no sentido de reação, de oposição a uma ação) psicológicas que temos, mesmo quando nos julgamos maduros, expressam reações irracionais originadas na época em que fomos educados, agravadas por circunstâncias sociais, ou de simples oposição, ou de aprovação incondicional das opiniões dos outros. Tenho falado aqui, insistentemente, de OPINIÃO, para que as pessoas procurem ser indivíduos, e não clones sociais, como tenho observado com desânimo.

Qual mulher, hoje, teria a coragem de dizer que vota em Bolsonaro ? E o medo do linchamento social ?




quarta-feira, 3 de outubro de 2018

Fantasia de personalidade e política

Nos últimos 2 meses (um pouco menos) o tema em minha atividade profissional se desviou do habitual pessoal para a política. Isto é inevitável perto de eleições. Mas esta eleição, pelo fato de estar se revelando muito agressiva (falo do ponto de vista das pessoas e não de atitudes coletivas, partidárias ou nacionais), está ajudando as pessoas a se exporem mais.

O Tema

Quando observamos, em períodos especiais da vida da sociedade, uma mudança no tema das conversas dos pacientes, temos a plena consciência de que a mudança da conversa de pessoal para focada na sociedade não é o desvio de interesse, nem tampouco de desvio do assunto cotidiano da vida deste paciente. A política, no âmbito da terapia, é apenas um TOQUE COSMÉTICO.

Explicando melhor. Falando de si, ou da sociedade, ou da situação política, o indivíduo está falando de si mesmo o tempo todo. Estando os olhos em posição tal que olham para fora do ser, e não para o seu interior, ele entende o mundo pelos reflexos dos olhares dos outros. Uma dos fatos que confirmam tal assertiva é o incômodo frequente e significativo que a pessoa sofre com a OPINIÃO DOS OUTROS.

A maior vitória do indivíduo, é ter uma consciência tão honesta de si mesmo, que a opinião dos outros não prevalece mais tão soberana em sua vida. Daí ele obtém sua redenção psíquica e psicológica. Ele até entende que a opinião do outro pode ser correta, mas não se guia obrigatoriamente por ela, mas pela sua convicção mesclada à sua aspiração.

Por exemplo. A pessoa comenta com um colega que quer fazer alpinismo. Ele lhe diz: "é muito perigoso". A pessoa, então, coleta esta opinião e diz: "vou arriscar". A opinião dop outro não é como uma ordem incondicional. É um comentário, é um conselho, uma forma de ver a situação, mas ela não é soberana sobre a vida da pessoa, e nem o pode ser.

No texto anterior tratei dos cuidados ao se dar uma opinião. Mas como nem todas as pessoas observam estes cuidados, é preciso aqui colocar as formas de se prevenir dos efeitos nefastos das opiniões de terceiros, muitas vezes apoiadas em:


  • Traumas pessoais;
  • Compromissos inconfessáveis;
  • Desvios de conduta(inveja, medo excessivo);
  • Falta de conhecimento;
  • Herança de personalidade;
  • Herança de opinião;
  • Confusão de sentimentos;


Destes, o mais perigoso, do qual sinto urgência em falar sobre é a ...

Herança de Personalidade.

Nossa personalidade é o nosso escudo para enfrentar o mundo. Mas o que eu estou querendo dizer ? Será que estou sugerindo que viver no mundo é tão perigoso que, cedo, precisamos construir um escudo para viver ?

Observe uma criança, até cerca de 4 anos (conferir a maravilhosa obra de Piaget a respeito dos marcos de avanço do desenvolvimento mental da criança). Ela se expõe, chega de peito aberto, é ingênua, não tem vergonha de dizer o que pensa, e nem de perguntar a respeito daquilo que desconhece, não tem orgulho, não tem soberba. É quase pura.

Mas após esta idade, começa a surgir um pouco de vergonha, pois a criança sabe que está sendo observada pelos outros. Daí surge a necessidade de construir barreiras para se proteger dos comentários e opiniões dos outros. E a primeira barreira que ela vê mais acessível é a das regras. É melhor obedecê-las do que contrariá-las e passar vergonha na frente dos outros.

Existe uma forma de lidar com o mundo, que só será descoberta mais tarde, quando existe desenvolvimento mental para isto, e que primeiramente pode vir na adolescência. O indivíduo pode, dependendo do seu grau de inteligência social:

  • Criar as próprias regras de conduta;
  • Seguir as regras de conduta já criadas por alguém mais "descolado" que ele;


Os pais da geração dos anos 2000 vão entender prontamente disto que estou falando. Esta geração vem querendo criar suas próprias regras de conduta baseadas ( não tenho nenhuma vergonha de dizer ):


  • Adesão às redes sociais;
  • Adesão ao consumo de maconha nas chamadas resenhas;
  • Vida paralela nos videogames;
  • Sexo em situação de quase relação física estável;


Não se escandalizem com estes fatos, pois são a pura verdade. Não é culpa soberana das famílias, mas sim de uma sociedade que não só não apóia como desestimula providências enérgicas, até por meio de leis.

Em termos comportamentais, as Leis não podem invadir os ritos e costumes da sociedade, a não ser que estes ritos e costumes ameacem a sobrevivência da sociedade. Em nosso país houve (e digo com toda a consciência e experiência de mãe) uma invasão nociva nos assuntos do núcleo familiar, pais e filhos.

Criou-se uma VERDADE COLETIVA de forma de vida cotidiana que não respeita opiniões individuais. Para se adaptar, pois o indivíduo tem que se defender, ideologias e filosofias coletivas foram sendo empurradas para cima dos jovens. Isto é claro demais, e foi percebido. Criou-se um modelo aceitável de personalidade, não só para evitar problemas, como para tornar as coisas mais fáceis e, controlando as pessoas, promover consumo e manter o poder político.

A maior parte das pessoas está falando do mesmo jeito, encarando problemas do mesmo jeito, e forçando uns aos outros a aceitar as novas verdades que alimentam um ciclo de novas ideologias, novas aceitações e novas ideologias sobre estas.

A quantidade de pacientes que herdaram a personalidade imposta do século XXI, uma imagem de correção politicamente correta, me assombra. Parece que estou orientando pessoas iguais. Falta opinião, falta estratégia pessoal de avanço, faltam ideias, faltam ações. Estou perplexa.

Voto é uma opinião

Eu disse que o tema mudou no consultório, mas que é apenas uma forma de expressão individual. O ser nunca pára de falar sobre si mesmo, alias isto é justamente o caminho para a aceitação individual (não digo cura).

A maior parte da conversa, nestes tempos de conturbação política, é "aquele falou isso", "esse outro falou aquilo" ou "olha só o que o candidato disse". Isto nada tem a ver com política, seja com os neuróticos já adaptados, seja com os neuróticos em tratamento. Tem a ver com ele mesmo, com a sua aceitação na sociedade. Existe, é claro, um elemento determinante. Como a pessoa não sabe qual será o resultado da eleição, ela, não se sentindo ainda adaptada à sociedade, segura de si, ela fica angustiada em relação a quem escolher.

Já começo a receber pacientes que brigaram com amigos e colegas, devido ao seu posicionamento político. Vamos traduzir o político pelo social, pois o que conta para o indivíduo é a sua posição na sociedade. Depois da eleição, a pessoa vai ter que conviver com o resultado por um longo tempo, pelo menos 4 anos. Algumas amizades poderão ser permanentemente perdidas.

Um derivado da herança de personalidade é a ...

Herança de opinião

Aqui já entrou a ideologia. Os efeitos são mais nefastos. A pessoa não vai só repetir comportamentos, mas até os discursos da PERSONALIDADE PADRÃO. A personalidade padrão é um ícone, uma pessoa eminente, conhecida, já aceita. Imitar as opiniões de uma pessoa já aceita, cultuada por uma grande parcela da sociedade, é UM DOS CAMINHOS MAIS FÁCEIS PARA A ACEITAÇÃO SOCIAL.

Então você deve estar compreendendo muito bem o que está ocorrendo há anos em nossa sociedade. Por preguiça, as pessoas estão praticamente passando em uma LOJA VIRTUAL e dizendo:

Me dê ai um cartão com uma opinião

Só que cada cartão não tem uma opinião diferente. Milhares ou milhões vem com a mesma opinião. Um dos balcões de opinião é o Facebook, outro é o Youtube, outro o Whatsapp.

E quem produz estas opiniões ? Os autores das ideologias criadas para controlar as pessoas.

Aviso

O leitor compreenda que pode estar tendo a existência de um clone da Personalidade Padrão, que pode estar fazendo o papel de mero autômato, e que pode estar tendo sérios prejuízos em sua personalidade. A sonhada adaptação rápida à sociedade pode se transformar em um fator de autodestruição.

Não lute pelas sua opiniões, e sim pelo aparelhamento mental, através do verdadeiro conhecimento filosófico, para compor com sabedoria os seus próprios traços de personalidade.